17/03/06

Lembram-se daquela "mania" que tenho de guardar recortes de jornais, revistas e outras coisas do género? Pois bem, estava por aqui a procurar uns papéis de que precisei de repente, e dou "de caras" com umas palavras de Pedro Rolo Duarte, que guardei na altura, porque achei deveras interessante, e muito actual. Vale a pena pensar um pouquinho nisto, digo eu!

E nós, "nas tintas"?
Preparo-me para escrever sobre o crime dos miúdos do Porto - e como esse caso é paradigmático da necessidade de rever o Código Penal -, quando o 24 Horas me surpreende com a história da miúda de 22 anos que tentou o suicídio porque foi recusada na escolha de actores dos Morangos com Açúcar.

Aparentemente, não há nenhuma relação entre um caso e outro. Mas ocorre-me, em relação a ambos, uma pergunta: que gerações andamos nós a formar, que mundo deixamos que exista sem rei nem roque? "Nós" somos todos, sem excepção; somos nós, adultos. Que gerações andamos a formar e de que forma nos envolvemos efectivamente (já nem digo afectivamente, para não parecer da "esquerda festiva"...) nos "caminhos" cada vez mais ínvios do "desconhecimento"?

Amamos a palavra "liberal" - a ideia de "cada um mais ou menos como quer" -, mas depois arrepiamos caminho e, ao vermos um bando de adolescentes matar, sem dó nem piedade, um travesti, exigimos prisão efectiva aos 14 anos de idade. Queremos ser pais modernos e entender o "fenómeno" dos Morangos, mas quando a miúda se atira da ravina, e fica a pedir uma entrevista em directo na TV, questionamo-nos sobre o sentido que tem uma sociedade que cultiva não o mérito nem o esforço, mas a fama fácil.

No fundo, dividimo-nos. Queremos o melhor do mundo liberal. Mas já agora, se puder ser, que nos proteja das suas próprias imperfeições e tentações.
Ora, não existe o melhor de dois mundos. Os miúdos que mataram selvaticamente o travesti no Porto são, aos 14 anos, tão conscientes do acto que praticam como o de 16 anos que ficou preso. A miúda que se atira "a matar" porque quer ser famosa no seu bairro, na sua rua, é igual aos filhos que temos em casa a lutar pelo comando do televisor para ver os Morangos. O que distingue aquele bando, e aquela adolescente, dos "nossos" miúdos - e só esta forma de colocar o problema já é, em si, reveladora... - é apenas a nossa presumível capacidade de vigiar, proteger, educar e acompanhar os filhos.
A verdade é essa: não somos todos iguais. E a questão que se põe é simples: os que não podem, não querem, ou não sabem, estão à mercê do mundo que escolhemos para ser o nosso.
Exibem-nos depois o quadro de miséria que não temos em casa.
E nós? Nas tintas para isso? Liberais até ao limite do horror?

- Pedro Rolo Duarte -